terça-feira, 10 de maio de 2011

Moedas de troca no comércio de africanos para escravização: Parte 2 - O tabaco do Nordeste brasileiro

Presa nos elos de uma só cadeia, 
A multidão faminta cambaleia, 
E chora e dança ali! 
Um de raiva delira, outro enlouquece, 
Outro, que martírios embrutece, 
Cantando, geme e ri!
                Castro Alves, O Navio Negreiro

Se o "zimbo da Bahia" (veja postagem anterior) forneceu uma quase inacreditável moeda para o comércio de africanos que eram forçados a vir como escravos ao Brasil, não era, no entanto, a única mercadoria que se levava à África. Dentre as muitas outras está o tabaco que se produzia no Nordeste brasileiro. Vale lembrar ao leitor que, durante os dois primeiros séculos da colonização, a região Nordeste foi, de longe, a mais valorizada economicamente, panorama que só passaria por considerável alteração quando da descoberta de minas de ouro nas Gerais e Goiazes (conforme expressões usuais na época, evidentemente).
Sobre o tabaco despachado da Alfândega da Bahia e que se reservava ao comércio no Continente Africano, escreveu André João Antonil (*), em sua legendária obra Cultura e Opulência do Brasil por Suas Drogas e Minas, de 1711:
"Deste tabaco se permite a extração de treze mil arrobas para a navegação da Costa da Mina, que se arrumam em cinco mil rolos pequenos de três arrobas, os quais também pagam a setenta réis por cada rolo para o sobredito contrato da Câmara, e importa mil cruzados."
A antiga arroba portuguesa equivale, no sistema métrico, a 14,688 kg e, portanto, 13 mil arrobas resultavam em 190.944 kg. Tirem-se daí as conclusões pertinentes ao montante de comércio que se realizava na África, sabendo, certamente, que o tabaco não era a única mercadoria que entrava nas trocas ali realizadas e que não apenas escravos eram comprados. Estes, porém, quase sempre destinados aos engenhos açucareiros no Brasil, eram embarcados para a longa e terrível viagem nos tumbeiros, nome vulgarmente dado aos navios negreiros que faziam a "carreira da África" e que era ironicamente explícito quanto à sua função, ao contrário do que ocorria com os escritos de muitos autores cultos, cujos eufemismos em relação à escravidão mencionei na postagem anterior.

(*) Para mais detalhes quanto à verdadeira identidade de André João Antonil, veja:
Antonil e a vida diária em um engenho de açúcar no Brasil Colonial

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