segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Os três reis magos, o rei Herodes e a obsessão pelo poder


Os três reis magos, no presépio mecânico de
Santana de Parnaíba, 
Natal de 2011 (¹)
Todo presépio que se preza tem, por suposto, além de Jesus, Maria e José, alguns pastores de ovelhas e três reis magos. Pode até ter outras personagens, mas as mencionadas não podem faltar. Ocorre que, dos quatro Evangelhos, só dois, o de São Mateus e o de S. Lucas, tratam do nascimento de Jesus. Destes dois, apenas o de São Mateus conta a visita dos magos. Não diz, entretanto, que eram três e, muito menos, que eram reis, apenas mencionando que vinham do Oriente. É de se perguntar se, sendo reis, o que teria ocorrido a seus respectivos reinos na sua ausência. Não obstante, a milenar tradição cristã assegura que sim, eram três, que eram reis, que formavam um grupo multiétnico e até lhes sabe os nomes: Gaspar, Melquior e Baltasar.
Em parte, entendem-se as inferências surgidas com o passar do tempo, por terem os magos, de acordo com a narrativa do Evangelho segundo S. Mateus, trazido três presentes - ouro, incenso e mirra - e também porque tais dádivas, tidas como preciosas, deviam provir de potentados orientais, que as apreciavam muito. Mas são apenas especulações.
Presépio vivo, parte de um Auto de Natal
contemporâneo 
representado em Holambra (SP)
no dia 9 de dezembro de 2012 (³)
Na Idade Média era usual que, diante das igrejas, fossem representadas pequenas peças, ou "Autos", cujos textos, geralmente memorizados, foram se perdendo, infelizmente, com o passar do tempo. Um dos que sobreviveram, ainda que apenas em fragmentos, é um Auto dos Reis Magos, datado do século XII, que apresenta esse interessante trechinho, no qual Herodes, rei da Judeia, expressa toda a sua irritação diante da notícia do nascimento de um novo rei (apenas um bebê desconhecido), que acabara de ouvir dos magos que haviam chegado a Jerusalém:
"Quem viu nunca tal mal,
Sobre rei outro tal!
Ainda não sou eu morto,
Nem sou na terra posto!
Outro rei acima de mim?
Nunca tal eu vi!
[...]
Por verdade não o creio,
Até que eu o veja."
Sabem os senhores leitores que a mania de agarrar-se ao poder não é coisa nova sobre a terra. Os monarcas da Antiguidade, aliás, eram exemplos acabados disso, mesmo quando se tratava apenas de um régulo como Herodes. A regra era deixarem o trono apenas quando morriam e, por ser essa regra obedecida é que tantos reis acabavam assassinados (²). Não era muito diferente a situação pela época em que o Auto dos Reis Magos foi composto, de modo que podemos ver nele, se quisermos, não apenas uma representação piedosa dos eventos ligados ao Natal, mas um retrato da mentalidade política medieval.
E não só medieval. É coisa da natureza humana... Ou não?!

(1) Fiz esta foto do belo presépio mecânico de Santana de Parnaíba, com personagens em tamanho um pouco acima do natural, conforme montado para o Natal de 2011. Instalado no centro histórico, era posto em funcionamento durante as noites do ciclo de festas natalinas. Ocorre que lá cheguei às dez horas da manhã, e os funcionários por ele responsáveis fizeram-me a enorme gentileza de, voluntariamente, irem ligá-lo para que eu pudesse fazer minhas fotografias e filmagem. Mesmo um ano depois, fica aqui meu agradecimento. Valeu, gente!
(2) Não foi o caso de Herodes, o Grande, embora ainda se discuta a natureza da enfermidade que o levou à morte.
(3) O presépio vivo é representado em Holambra há 12 anos. Em 2012, além de contar a origem do Natal, a representação incluiu uma referência aos valores cristãos no mundo atual. Bela encenação. Se você não viu a deste ano, talvez possa fazer planos de estar lá no ano que vem.


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