domingo, 6 de abril de 2014

Rabanetes, cebolas e alhos

A alimentação dos construtores de pirâmides no Egito Antigo


História contada por Heródoto: ao visitar a pirâmide de Quéops, viu nela uma inscrição que relatava quanto se gastara, em sua  construção, apenas para o fornecimento de rabanetes, cebolas e alhos para os trabalhadores e capatazes. Interrogando um intérprete, este lhe teria dito que a soma alcançava nada menos que 4600 talentos de prata.
Acalmem-se, leitores: rabanetes, cebolas e alhos não eram, por suposto, os únicos alimentos dos quais se serviam os egípcios. Eram, no entanto, parte importante de sua dieta. Sim, podem fazer uma careta, mas continuem a ler...
Talento era uma unidade de massa que se empregou largamente na Antiguidade, em especial para a medida de metais preciosos, tais como o ouro e a prata. O problema é que cada região tinha o talento que queria - não estou fazendo nenhum trocadilho - de modo que a tal medida variava consideravelmente. Para os gregos, um talento corresponderia a cerca de vinte e seis quilos, enquanto que para os babilônios, podia chegar a mais de sessenta.
Ora, Heródoto era grego, e parece-me bem razoável que calculemos quanto se gastou em rabanetes, cebolas e alhos usando simplesmente o talento grego. Vejamos:
Se um talento equivale a vinte e seis quilos, e foram gastos quatro mil e seiscentos talentos de prata, devemos concluir que a despesa subiu a nada menos que cento e dezenove mil e seiscentos quilos. Incrível? Talvez não, se considerarmos que incríveis, na verdade, eram as dimensões da pirâmide, construída, em essência, à força de músculos de seres humanos que, como acertadamente assinalou Heródoto, precisavam de ferramentas, vestuário e comida, na qual se incluía, como vimos, uma enorme quantidade de rabanetes, cebolas e alhos. Não era, por certo, uma sorte a ser invejada, a desses edificadores de pirâmides.
É importante notar que Heródoto, que afirmou ter visitado o Egito, viveu muito tempo depois da construção das pirâmides. Por essa razão, não se pode considerar que seus relatos sejam uma expressão fiel da realidade em todos os seus detalhes. Hoje sabemos que muito do que dizia não passava de conversa fiada, intencionalmente ou não. Às vezes, muita tolice podia derivar de uma interpretação equivocada dos fatos, que se compreende até com facilidade vindo ele de uma cultura e idioma diferentes. Ainda, assim, seus relatos são importantes, já que, a despeito das óbvias imperfeições, contribuem para que tenhamos uma ideia do modo de vida adotado pelos antigos egípcios, com informações que a egiptologia contemporânea tem, efetivamente, validado. Ou seja, não podemos ter certeza absoluta quanto ao total gasto (eram comuns, na época, os exageros), mas quanto a rabanetes, cebolas e alhos serem parte importante da dieta não temos dúvidas, já que há várias outras fontes que mencionam o fato. E, em História, a diversidade de fontes é sempre muito desejável.


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