quarta-feira, 23 de julho de 2014

Quanta cana um engenho real podia moer

Cana-de-açúcar (²)
De acordo com Antonil, um engenho real (com roda d'água) moía, semanalmente, as seguintes quantidades de cana-de-açúcar, no Século XVIII:
- Diariamente: 25 a 30 carros de cana;
- Semanalmente: até sete vezes a quantidade diária (o que significa que um engenho, nesse caso, funcionava os sete dias da semana, sem interrupções).
Explica o Padre Antonil (ou Andreoni...):
"No espaço de vinte e quatro horas é moída uma tarefa redonda de vinte e cinco até trinta carros de cana, e em uma semana das que chamam solteiras (que vêm a ser, sem dia santo), chegam a moer sete tarefas." (¹)
Era, para a capacidade do maquinário da época, uma quantidade enorme de cana, que resultava em lucros (grandes) para os senhores de engenho, para os que transportavam o açúcar até a Europa (lucros maiores) e para os que, depois de refinado o açúcar, vendiam-no nos mercados europeus (lucros muito maiores).
Essa quantidade de cana moída valia, como já disse, para os engenhos d'água, também chamados engenhos reais, que eram muito superiores em capacidade de moagem aos engenhos-trapiches, mais conhecidos como "engenhocas", e que eram, geralmente, movidos por animais (os muito pequenos usavam escravos para mover o maquinário). Mas havia, ao menos no Nordeste açucareiro, um grave problema em relação aos engenhos d'água: a falta exatamente dela, a água, quando, durante as longas estiagens, tão frequentes na região, os cursos d'água que moviam o maquinário chegavam a secar. Por isso, mesmo havendo cana para moer durante o ano todo, nem sempre isso acontecia - não por faltar a cana, e sim a água. Foi o que explicou o Padre Fernão Cardim, jesuíta, em carta ao Provincial de sua Ordem, datada dos anos oitenta do Século XVI:
"Tornando aos engenhos, cada um deles é uma máquina e fábrica incrível, uns são de água rasteiros, outros de água copeiros, os quais moem mais e com menos gasto, outros não são d'água, mas moem com bois, e chamam-se trapiches; estes têm muito maior fábrica e gasto, ainda que moem menos, moem todo o tempo do ano, o que não têm os d'água, porque às vezes lhes falta." (³)

(1) ANTONIL, André João (Giovanni Antonio Andreoni). Cultura e Opulência do Brasil por Suas Drogas e Minas. Lisboa: Oficina Real Deslandesiana, 1711, p. 53.
(2) PISO/PIES, Willen et MARKGRAF, Georg. Historia naturalis Brasiliae. Amsterdam: Ioannes de Laet, 1648, p. 83. A imagem foi editada para facilitar a visualização neste blog.
(3) CARDIM, Pe. Fernão, S. J. Narrativa Epistolar de Uma Viagem e Missão Jesuítica. Lisboa: Imprensa Nacional, 1847, p. 54.


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