terça-feira, 5 de outubro de 2010

Registrando os sons - Parte 1: Fonógrafos e gramofones

Até meados do século XIX, se alguém queria ouvir música, tinha, via de regra, duas opções: podia cantar e tocar em casa, tendo por vezes como plateia  um grupo de familiares e amigos, ou ir a um teatro, onde instrumentistas e cantores se apresentavam. Pela mesma época, nas sessões legislativas, nos tribunais ou em outras circunstâncias em que registrar as palavras de alguém era importante, notava-se sempre a presença de profissionais chamados taquígrafos ou estenógrafos, que asseguravam que o que se dizia não seria perdido.
Isso nos remete a uma questão fundamental: o som é transitório, ao menos na percepção humana, uma vez que, como indivíduos, não temos qualquer controle sobre a propagação das ondas sonoras que alguma vez emitimos. Isso significa que, como expressão artística, a música enfrentava um problema que não atinge as artes plásticas: uma pintura ou escultura, uma vez concluída, pode ser continuamente admirada, pois tem, materialmente, uma longa duração. Exemplificando, embora seja discutível se pinturas rupestres podem ser consideradas arte, já que não sabemos se seus autores tinham efetivamente a intenção de "fazer arte", ou se, por outro lado, viam em suas representações alguma finalidade meramente utilitária (a crença talvez, de que representar uma caçada de sucesso podia, de algum modo, assegurar que isso viesse a acontecer), é certo que têm perdurado por milênios e podem ser observadas por pessoas do nosso século. Não é assim com a música - que apaixonado por piano não daria tudo para ouvir o próprio Beethoven a executar algumas de suas sonatas? Mas, diremos, é impossível! Os sons perderam-se no tempo, e agora podemos apenas fazer ilusórias tentativas de imaginar como seriam.
Entretanto, por volta da década de 1850, trabalhava-se já no sentido de criar algum meio de registrar os sons, abrindo imensas possibilidades para a arte, para a preservação da memória histórica, para o entretenimento.
Um "fonoautógrafo" foi inventado em 1857, mas o aperfeiçoamento que possibilitaria a comercialização precisou esperar um pouco mais: data de 1877 o fonógrafo de Thomas Edison e de dez anos mais tarde o gramofone de Emil Berliner. A diferença entre eles? O primeiro usava um cilindro gravado, enquanto o último já usava discos, uma inovação que faria o modelo triunfar e, com extremo progresso, existir até hoje. Já os cilindros foram aposentados em 1912, embora os já existentes continuassem, como é lógico, a ser usados ainda por algum tempo.

Anúncio de fonógrafo na revista especializada Echo Phonographico
publicada em São Paulo, edição de janeiro de 1904
Curiosamente, os cilindros, em termos de reprodução dos sons, eram vantajosos por apresentarem menos ruído que os discos, mas estes, por seu turno, eram muito mais duráveis e permitiam gravações mais longas, daí a preferência que vieram a ter do público em geral.

Anúncio de cilindros para fonógrafo, também na revista Echo Phonographico de janeiro de 1904

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6 comentários:

  1. os fonografos usavao selindros de 4 minutos e de 8 minutos era usado so 2 veses

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    1. Os Fonógrafos usam cilindros revertidos de cera, de 2 ou 4 minutos que podem ser utilizados centenas de vezes.

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    2. Senhores, havia no comércio brasileiro, pela época do começo do Século XX, vários tipos diferentes de cilindros à venda, com uma certa variação de preço e de qualidade também. Os de maior preço eram aqueles que podiam, para falar em linguagem contemporânea, ser reciclados, e eram, geralmente, aceitos como parte do pagamento de cilindros novos, coisa que não ocorria com os cilindros de qualidade inferior. Além disso, vale notar que o processo foi sendo aperfeiçoado, com o passar do tempo. Entre a primeira gravação de T. Edison, a cançãozinha "Mary has a little lamb" e os produtos que se tornaram comerciais havia uma grande diferença de duração e qualidade acústica.
      Os discos, que vieram depois, eram muito mais duráveis, e por isso ganharam espaço. Atualmente esses aparelhos antigos voltaram à moda, mas não podemos esquecer que os produtos para eles estão sendo fabricados com tecnologia atual e não segundo os métodos de mais de cem anos atrás.
      Obrigada por visitarem "História & Outras Histórias". Continuem participando!

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  2. Os cilindros eram "recicláveis", ou seja, havia lojas que trocavam cilindros velhos por novos, já que os velhos podiam receber uma nova camada de cera para regravação. Ainda hoje, em lojas de antiquários, é possível encontrar cilindros assim, que funcionam razoavelmente bem (para os padrões da época, claro).

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  3. Olá Marta Iansen, parabéns pelo trabalho, sou especialista em máquinas falantes e tudo que envolve este universo, confirmando sua informação, tenho um pequeno folheto da Casa Edison de São Paulo informando que aceitavam cilindros já gravados como parte do pagamento de um novo cilindro, tenho também dezenas de "bons" cilindros, que tem a musica totalmente preservada e podem ser ouvidos em qualquer fonógrafo de Edison e Columbia (Graphophone)
    Se quiser conhecer o acervo e ouvir musicas de 1890, 1900...está convidada, moro em SP capital. Abraços.

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    1. Olá, Andreas Triantafyllou,
      Hmmm, seu acervo deve ser muito interessante! Estou temporariamente longe de São Paulo, mas, quando for possível, gostaria de conhecer.
      Obrigada pela visita ao blog. Apareça sempre!

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