domingo, 26 de junho de 2011

O uso de documentos históricos no trabalho do historiador

Como os historiadores sabem e interpretam o que aconteceu no passado? No que tange à maior parte do tempo histórico não é, certamente, por terem estado lá...
Para que um historiador possa refletir sobre um determinado acontecimento, ou mesmo encaminhar uma reconstituição, é preciso que haja documentos, relatos, provas, enfim, desse acontecimento, ou que ao menos sejam possíveis inferências a partir de outros fatos já conhecidos. Sem a existência de documentos comprobatórios é quase impossível uma abordagem científica. Máquina do tempo? Por enquanto, só mesmo em filmes e desenhos animados.
A lista de possíveis "documentos históricos" beira o ilimitado. Nela pode incluir-se qualquer coisa que ofereça informações úteis - obras literárias, artesanato, moedas, fotografias, restos de tecidos, antigas construções, registros cartoriais, diários, receitas culinárias, jornais, armas, móveis - vê-se facilmente que, nesse sentido, quase tudo poderia ser útil. Mas cabe aqui uma ressalva muito importante: por mais interessantes que sejam esses artefatos todos, eles não são a História, são apenas instrumentos que contribuem para que o trabalho do historiador seja possível. Nada, mas nada, mesmo, substitui a competência interpretativa de quem analisa os documentos para, a partir deles, construir uma imagem viável do passado.
Vejamos como, eventualmente, o estudo do passado pode ser comprometido por interpretações equivocadas.
Quando um historiador consulta autores antigos, é necessário ter o máximo de cuidado na análise do que escreveram. Nem sempre as coisas aconteceram exatamente como são descritas e somente o treino e a experiência conduzem a uma percepção apurada no sentido de identificar eventuais distorções dos fatos, sejam elas intencionais ou não.
Pode-se exemplificar a questão com a maneira usada pelos povos da Antiguidade ao narrar acontecimentos. Essas narrativas são, é claro, documentos históricos e, portanto, objeto de estudo dos historiadores, mas geralmente não podem ser tomadas ao pé da letra, se o que se pretende é obter uma interpretação apropriada. Por quê? Bem, os povos antigos não adotavam o mesmo conceito de História que nós e, por isso, suas narrativas são, quase sempre, entremeadas de coisas que consideramos ficção, mas que eles tinham na conta de realidade, como a interferência dos deuses nos acontecimentos humanos (os gregos eram ótimos nisso...). Outro fator significativo a ser considerado é a variedade de percepção do tempo em diferentes culturas, sem falar na enorme variedade de calendários, conceitualmente tão diversos do nosso. A propósito, é justamente em decorrência dessa dificuldade de compreensão do conceito de tempo, bem como do calendário de culturas muito diferentes da nossa que surgem, ocasionalmente, interpretações algo esdrúxulas, invocando supostas profecias e arrastando multidões crédulas e desinformadas a uma expectativa absurda de uma derrocada cataclísmica da Terra.
A conclusão inevitável disso tudo, leitor,  é que os humanos do século XXI acham-se muito sábios em relação aos das antigas civilizações, mas, surpreendentemente, gostam de preservar a mesma tendência de misturar fato e ficção, malgrado todo o avanço científico e tecnológico.

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