terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Os preços dos alimentos nas minas de ouro do Brasil Colonial no início do Século XVIII

A corrida às minas de ouro conhecidas como "Gerais" nos últimos anos do século XVII e primeiras décadas do século XVIII provocou uma elevação brutal nos preços dos gêneros alimentícios em boa parte do Brasil - nas minas quase nada se cultivava e, desse modo, os gêneros de subsistência para ali direcionados chegavam a preços absurdos, quer por sua óbvia falta, quer pela dificuldade de transporte e, nas áreas produtoras, escasseavam e subiam de preço em virtude da "exportação".
A população das minas, predominantemente urbana, cresceu muito depressa, sendo composta por empreendedores da mineração e sua multidão de escravos, além de faiscadores livres, comerciantes, funcionários públicos e outros mais. Consta, em virtude desse fato, que tão ricos quanto alguns mineradores (e com menor risco nos negócios) tornaram-se alguns comerciantes de gêneros alimentícios e artigos básicos de vestuário. Qual o segredo? Recebiam sempre em ouro, sem ter de provar a sorte na procura da riqueza que se arrancava da terra com o suor da escravaria.
Sobre os preços alcançados pelos alimentos nessas circunstâncias existe o excelente relato de Antonil (c. 1711), a partir do qual tem-se a tabela abaixo:

Alimentos consumidos nas minas e seus respectivos preços, de acordo com Antonil (¹)
uma rês ...................................................................... 80 oitavas (²)
um boi ....................................................................... 100 oitavas
sessenta espigas de milho ......................................... 30 oitavas
um alqueire (³) de farinha de mandioca .................... 40 oitavas
seis bolos de farinha de milho ................................... 3 oitavas
um paio ...................................................................... 3 oitavas
um presunto de oito libras (⁴) .................................... 16 oitavas
um pastel pequeno ..................................................... 1 oitava
uma libra de manteiga de vaca .................................. 2 oitavas
uma galinha ............................................................... 3 ou 4 oitavas
seis libras de carne de vaca ....................................... 1 oitava
um queijo da terra ..................................................... 3 ou 4 oitavas
um queijo flamengo ....................................................16 oitavas
um queijo de Alentejo ............................................... 3 ou 4 oitavas
uma caixa de marmelada ...........................................3 oitavas
um frasco de confeitos de quatro libras ................... 16 oitavas
uma arroba (⁵) de açúcar .......................................... 32 oitavas
um barril pequeno de azeite ..................................... 2 libras

Note-se, mais uma vez, que tudo se cotava em ouro, não em moeda corrente. Observe-se, também, a exorbitância dos preços, já que, muitas vezes esfomeados, os mineradores pagavam o que se lhes pedia por comida, havendo não poucos registros de gente que morreu de fome, por absoluta falta de víveres, ainda que rodeada de ouro.
Assim como na matalotagem dos navegantes, também nas minas eram consumidos alimentos que podiam suportar o transporte em estado satisfatório de conservação (ao menos para os padrões da época) e, antes que alguém faça objeções, lembro que o gado era conduzido vivo por tropeiros até o local do abate, não sendo, por isso, uma exceção. Mais tarde o charque resolveria, em parte, esse incômodo.

Lavagem do ouro nas minas (⁶)

(1) ANTONIL, André João (Giovanni Antonio Andreoni). Cultura e Opulência do Brasil por Suas Drogas e Minas. 1711. 
(2) 1 oitava corresponde a cerca de 3,58 gramas.
(3) 1 alqueire corresponde a 13,8 litros.
(4) 1 libra corresponde a 0,453 gramas.
(5) 1 arroba corresponde a cerca de 14,7 quilogramas.
(6) TAUNAY, Hippolyte et DENIS, Ferdinand. Le Brésil, ou Histoire, Moeurs, Usages et Coutumes des Habitants de Ce Royaume, vol. 3. Paris: Nepveu, 1822.


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