quarta-feira, 2 de julho de 2014

Quanto se pagava a um capelão de engenho no Brasil Colonial

Os engenhos de açúcar do Período Colonial eram localizados em áreas que deviam estar perto o suficiente dos portos para que o embarque do açúcar, com destino à Europa, fosse viável. Mas deviam estar, também, em áreas nas quais tanto o solo quanto o clima fossem favoráveis ao cultivo da cana em larga escala. Além disso, precisavam ter matas nas proximidades, já que o consumo de lenha seria alto. E, não menos importante, no caso dos engenhos d'água (ou "engenhos reais"), precisavam dispor de água corrente com força capaz de girar as chamadas rodas d'água.
Vê-se, portanto, que, da escolha acertada da localização dependia, em medida considerável, o sucesso de um novo empreendimento açucareiro. Por isso, a maioria dos engenhos acabava por constituir-se em unidades econômicas tão autônomas quanto possível, já que nem sempre a localização favorável estava perto de uma vila ou cidade importante.
Ora, nos tempos coloniais, as pessoas eram, em geral, muito religiosas, mesmo aquelas que não poderiam ser reputadas como modelos de virtudes. Assim, entre as instalações de um engenho estava sempre uma capela e, para manter a regularidade dos ofícios religiosos, entre os trabalhadores livres os senhores de engenho faziam constar um padre, que era assalariado, conforme conta o Padre Fernão Cardim, em carta datada dos anos oitenta do Século XVI:
"O Padre Quirício Caxa e eu pregamos algumas vezes nas ermidas que quase todos os senhores de engenhos têm em suas fazendas, e alguns sustentam capelão à sua custa, dando-lhe quarenta ou cinquenta mil réis cada ano, e de comer à sua mesa." (*)
Qual era o poder aquisitivo do salário anual que recebia um capelão de engenho? Apenas para efeito de comparação, vale lembrar que, no Século XVI, em São Paulo, onde a quantidade de escravos indígenas era muito grande, o preço de um nativo escravizado, de acordo com a idade e capacidade para o trabalho, além da tribo de origem, variava, mais ou menos, entre 5 e 15 mil réis. Ou seja, se não era regiamente pago, um capelão, por outro lado, não sendo alguém de grandes ambições, podia levar uma vida razoável, para os padrões da época e condições proporcionadas pela Colônia.
O hábito de ter um padre capelão foi mantido, com o passar do tempo, mesmo porque era símbolo de status, para um senhor de engenho, ter quem celebrasse missas, batizasse as crianças e fizesse casamentos em sua capela. Mais de cem anos depois do Padre Cardim, Antonil, em sua famosa obra Cultura e Opulência do Brasil Por Suas Drogas e Minas, mencionaria os capelães entre os funcionários livres assalariados que os engenhos precisavam ter.

(*) CARDIM, Pe. Fernão, S. J. Narrativa Epistolar de Uma Viagem e Missão Jesuítica. 
Lisboa: Imprensa Nacional, 1847, p. 52.


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