segunda-feira, 16 de maio de 2016

Para quem escrevem os historiadores?

Políbio, um grego cuja obra data do Século II a.C., escreveu: 
"Um historiador tem por obrigação relatar à posteridade, tanto o que pode desonrar e trazer descrédito a alguém, como aquilo que pode enaltecer." (*)
Vejam os leitores que essa pequenina citação seria apropriada como ponto de partida para uma discussão sobre o papel de figuras individuais na História, que, na visão de Políbio, poderiam ser enaltecidas ou desacreditadas pelo que delas dissessem os historiadores. Mas o assunto de hoje é outro. 
Para Políbio, o trabalho do historiador era tratar dos eventos de seus dias, ou seja, do presente, para benefício das gerações futuras (a "posteridade"), que teriam, assim, como compreender os eventos do passado. A maioria dos historiadores da atualidade tem uma perspectiva muito diferente, uma vez que são investigados e interpretados os eventos do passado, para que sejam lidos e estudados pela geração atual. Em poucas palavras, Políbio entendia que o historiador escrevia para o futuro; hoje, escrevemos para leitores do presente.
No Século II a.C. os livros, uma vez escritos, multiplicavam-se muito lentamente, porque eram copiados à mão, de modo que seu preço era elevado. Além disso, a alfabetização, na maioria das culturas, estava longe de ser generalizada, a subsistência era obtida a duras penas, pouca gente tinha tempo, dinheiro e conhecimento para apreciar a obra dos historiadores. Não é difícil entender, pois, que Políbio tivesse a expectativa de ser lido por gente do futuro: ele e muitos outros cronistas escreviam sobre os acontecimentos que presenciavam, que seus contemporâneos conheciam e a cujo respeito teriam pouco interesse em ler. Seu público ideal, supomos, seriam as gerações futuras, quando quisessem conhecer os eventos do passado. Não cabia, então, em seus escritos, nenhuma ideia de transformação social, de chamar a atenção para a necessidade de mudança na vida política ou mesmo de protesto contra injustiças gritantes no sistema vigente. Isso, como se sabe, só iria passar pela cabeça de (alguns) historiadores, militantes ou não, muito tempo depois.

(*) A citação da História de Políbio que aparece nesta postagem é tradução de Marta Iansen para uso exclusivo no blog História & Outras Histórias.


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