quinta-feira, 4 de maio de 2017

Os doze trabalhos de Hércules - um herói descontrolado e sua coroa de salsa

Há salsa (¹) na sua horta, leitor? Pois fique então sabendo que o grande Hércules (²) - é coisa da mitologia grega - usou, em certa ocasião, uma coroa de salsa. Em memória desse acontecimento obviamente lendário, os atletas que venciam nos jogos de Nemeia, bem como nos Jogos Ístmicos, recebiam, como prêmio, não uma coroa de louros, e sim uma de salsa. Isso é que é glória fugaz!...
E, por falar em Hércules, que tal relembrar o que a mitologia dos antigos gregos dizia sobre os doze trabalhos executados por esse herói descontrolado, que num acesso de fúria matou a mulher e os filhos? Sim, porque foi depois disso que, disposto a cumprir uma espécie de severa penitência, Hércules teve de realizar os tais trabalhos, tão célebres que, de boca em boca, já ninguém sabia ao certo quais eram, e até poderiam ser quatorze ou quinze. Arbitrariamente, vai aqui uma lista de doze dos mais recorrentes nos relatos antigos.

1. Primeiro trabalho (³) - Hércules mata o leão de Nemeia, famoso por atacar animais de pastoreio. Como a pele do leão era imune às setas de Hércules, só restou ao herói agarrar tão notável fera e matá-la com as próprias mãos. A propósito, Hércules era frequentemente representado com uma pele de animal sobre os ombros: a pele do leão de Nemeia.

2. Segundo trabalho - Hércules mata a hidra de Lerna. Mas que bicho era esse? Uma serpente de sete cabeças. Se uma cabeça era cortada, nasciam logo outras sete... Cortar cabeças da hidra resultaria, sem demora, em um curioso problema matemático. Portanto, Hércules resolveu a questão colocando fogo no lugar em que vivia a hidra. Morto o animal, teve a ideia de usar o sangue venenoso que dele escorria para preparar flechas com pontas que causavam feridas incuráveis.

3. Terceiro trabalho - Hércules captura, vivinho da silva, o javali de Erimanto, um animal tão perigoso quanto célebre pelos estragos que fazia. O caso é que Hércules precisou capturar o javali à unha, depois de uma correria insana.

4. Quarto trabalho - Do brutal para o meigo: Hércules captura, também viva, a corça de Cerineia, que tinha chifres de ouro e patinhas de bronze. Haja esforço! Hércules teve de andar à sua procura durante nada menos que um ano.

5. Quinto trabalho - Hércules mata os pássaros do lago Estínfalo. Não eram pássaros quaisquer: tinham dimensões gigantescas e seus bicos eram de ferro. Os cruéis voláteis matavam quem quer que ousasse se aproximar. Hércules, porém, fazendo uso de algumas das setas envenenadas com o sangue da hidra de Lerna, pôs fim à ameaça.

6. Sexto trabalho - Hércules captura e doma um touro feroz que aterrorizava a ilha de Creta (isso lembra outra história, não é?).

7. Sétimo trabalho - Hércules colhe maçãs de ouro no jardim das Hespérides (⁴). Que haveria de incomum nisso, a não ser o fato de que as maçãs eram de ouro? É que o tal jardim era guardado por uma criatura antipática, ou seja, um dragão de cem cabeças. Hércules, porém, não precisou matar o dragão, já que a ingrata tarefa coube ao gigante Atlas, a quem competia, com as costas e braços, sustentar o céu, para que não despencasse. Enquanto Atlas matava o dragão, Hércules ficou encarregado de segurar o céu. Depois, só fez o trabalho leve de entrar no jardim e colher as maçãs.

8. Oitavo trabalho - Hércules limpa os estábulos do rei Áugias. Parece fácil? Os estábulos não eram limpos há trinta anos, de modo que seu cheiro horrendo andava a tornar a vida insuportável em toda a Grécia. "Marmelada", dirão: Hércules, após desviar o curso de um rio, fazendo com que as águas, qual inundação, lavassem os estábulos, concluiu a tarefa em um só dia.

9. Nono trabalho - Hércules, depois de dominar as éguas de Diomedes, rei da Trácia, joga o próprio monarca para ser devorado por elas. É que as éguas, ao contrário dos animais de sua espécie, eram carnívoras e, habitualmente, alimentadas com a carne de quaisquer estrangeiros que chegavam ao reino de Diomedes. Problema resolvido!

10. Décimo trabalho - Depois de derrotar as famosas amazonas, Hércules rouba o cinto mágico de Hipólita, a rainha guerreira.

11. Undécimo trabalho - Hércules mata Gerion, singular figura dotada de três corpos, seis braços e, ainda por cima, seis asas. O assassinato tinha por objetivo capturar os bois que eram propriedade de Gerion. Detalhe: os bovinos eram guardados dia e noite por um cão feroz (que tinha duas cabeças), e por um dragão (de sete cabeças). Hércules deu jeito nos dois, é claro. Esse trabalho bem poderia ser classificado como morticínio em série, já que morreram Gerion, o cão e o dragão.

Hércules enfrentando Gerion, de acordo com uma ânfora grega (⁵)
12. Duodécimo trabalho - Hércules vai ao mundo dos mortos para buscar Cérbero, o cão terrível que guardava a entrada dos domínios de Hades (⁶). Interessante é que, ciente de que Hércules apenas executava aquilo que o deus Destino previra para sua vida, Hades consentiu na captura de Cérbero, desde que seu animal de estimação não fosse morto e que o herói não usasse armas. Será preciso dizer que Hércules concluiu com sucesso mais essa façanha? Cérbero, depois de ser apresentado triunfalmente ao rei Euristeu (⁷), foi devolvido a seu legítimo proprietário.

Não se enganem, leitores. O significado dos mitos ligados a Hércules (assim como acontece com todos os demais), vai muito além daquilo que está à superfície. Basta pensar um pouco.

(1) Petroselinum crispum. Para evitar que os leitores de língua espanhola tenham problemas em entender o texto, quero lembrar que "salsa", em português, é o mesmo que "perejil" em espanhol.
(2) Ou Héracles.
(3) Na Antiguidade, enquanto as lendas eram relatadas oralmente, parece que não havia uma ordem fixa para os trabalhos. Por isso, diferentes autores referem os trabalhos em ordens distintas. Aqui são apresentados segundo uma das sequências mais comuns. Os trabalhos, sempre doze, também variavam de um relato para outro.
(4) Filhas de Atlante - a mitologia vai longe...
(5) BUSCHOR, Ernst. Griechische Vasenmalerei. Mûnchen: R. Piper & Co., 1913, p. 111.
(6) Divindade que, segundo a mitologia grega, dominava o submundo ou mundo dos mortos.
(7) Segundo a mitologia, Euristeu era um pérfido meio-irmão de Hércules, encarregado de verificar o cumprimento das tarefas propostas ao herói.


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2 comentários:

  1. Tive contato e me apaixonei por mitologia lendo Os Doze Trabalhos de Hércules, de Monteiro Lobato. Claro, as mesmas aventuras temperadas com falas dos personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo. Uma delícia e já li muito para meus filhotes. Uma maravilha... Obrigada por essas lembranças e, como você disse, há muito mais por trás dessas histórias... Abraços

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    1. Também li muito Monteiro Lobato quando era criança. Não estou certa de que tenha lido todos os livros, mas devo ter chegado perto.
      Um abraço, tenha um ótimo final de semana!

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